quarta-feira, 29 de novembro de 2023

29ª AULA: REGIÃO NORDESTE!

Através de aula expositiva dialogada, o professor explicou, tendo por base os critérios da regionalização dos "Três Complexos Regionais", os principais elementos da Região Nordeste do Brasil.

Os elementos vistos, bem como, as suas conceituações, foram: 

- a monocultura/ latifúndios: cana-de-açúcar (em toda a região nordestina), algodão (Maranhão) e pecuária (Sertão) 

- a destruição do bioma Mata Atlântica

- destruição do solo (por causa da cana-de-açúcar)

- ocupação e atividades voltadas somente para o enriquecimento de Portugal

Em seguida, aos alunos foram passadas, no quadro, uma série de questões para que eles mesmos complementassem seus estudos, com base na leitura do livro didático.

Para recompor o que foi estudado em aula, aconselha-se a leitura abaixo:

O ASSASSINATO DA TERRA NO NORDESTE DO BRASIL


As colônias espanholas proporcionavam, em primeiro lugar, metais. Muito cedo  descobriram-se, nelas, os tesouros e os veios. O açúcar, relegado a um segundo plano, foi cultivado em São Domingos, depois em Veracruz, mais tarde na costa peruana e em Cuba. Entretanto, até meados do século XVII, o Brasil foi o maior produtor mundial de açúcar. Simultaneamente, a colônia portuguesa da América era o principal mercado de escravos: a mão-de-obra indígena, muito escassa, extinguia-se rapidamente nos trabalhos forçados, e o açúcar exigia grandes contingentes de mão-de-obra para limpar e preparar os terrenos, plantar, colher e transportar a cana e, por fim, moê-la e purgá-la. A sociedade colonial brasileira, subproduto do açúcar, floresceu na Bahia e Pernambuco, até que o descobrimento do ouro transferiu seu núcleo central para Minas Gerais.


As terras foram cedidas, pela Coroa portuguesa, em usufruto, aos primeiros grandes senhores de terra do Brasil. A façanha da conquista tinha de correr paralelamente à organização da produção. Somente doze “capitães” receberam, por carta de doação, todo o imenso território colonial virgem, para explorá-lo a serviço do monarca. Todavia, foram capitais holandeses os que financiaram, em maior medida, o negócio, que foi, em resumo, mais flamengo do que português. As empresas holandesas não só participaram na instalação dos engenhos e na importação dos escravos; além disso, recolhiam o açúcar bruto em Lisboa, refinavam-no, ganhando lucros que chegavam à terça parte do valor do produto, e o vendiam na Europa. Em 1630, a Dutch West India Company invadiu e conquistou a costa nordeste do Brasil, para assumir diretamente o controle do produto. Era preciso multiplicar os lucros, e a empresa ofereceu aos ingleses da ilha de Barbados todas as facilidades para iniciar a cultura em grande escala nas Antilhas. Trouxe ao Brasil colonos do Caribe, para que aqui, em seus novos domínios adquirissem os necessários conhecimentos técnicos e a capacidade de organização. Quando os holandeses foram por fim expulsos do Nordeste brasileiro, em 1654, já tinham estabelecido as bases para que Barbados se lançasse numa competição furiosa e ruinosa. Haviam levado negros e raízes de cana, levantado engenhos e tinham todos os implementos. As exportações brasileiras caíram bruscamente para a metade, e os preços baixaram 50% no fim do século XVII. As Antilhas estavam mais perto do mercado europeu, Barbados tinha terras ainda virgens e produzia com melhor nível técnico. As terras brasileiras estavam cansadas. A formidável magnitude das rebeliões dos escravos no Brasil e a aparição do ouro no Sul, que arrebatava mão-de-obra às plantações, precipitaram também a crise do nordeste açucareiro. Foi uma crise definitiva. Prolonga-se, arrastando-se penosamente de século em século, até nossos dias.


O açúcar arrasou o Nordeste. A faixa úmida do litoral, bem regada por chuvas, tinha um solo de grande fertilidade, muito rico em húmus e sais minerais, coberto por matas tropicais da Bahia até o Ceará. Esta região de matas tropicais converteu-se, como diz Josué de Castro, em região de savanas. Naturalmente nascida para produzir alimentos, passou a ser uma região de fome. Onde tudo germinava com exuberante vigor, o latifúndio açucareiro, destrutivo e avassalador, deixou rochas estéreis, solos lavados, terras erodidas. Fizeram-se, a princípio, plantações de laranjas e mangas, que foram abandonadas e se reduziram a pequenas hortas que rodeavam a casa do dono do engenho, exclusivamente reservadas para a família do plantador branco. Os incêndios que abriam terras aos canaviais devastaram a floresta e com ela a fauna; desapareceram os cervos, os javalis, as toupeiras, os coelhos, as pacas e os tatus. O tapete vegetal, a flora e a fauna foram sacrificadas, nos altares da monocultura, à cana-de-açúcar. A produção extensiva esgotou rapidamente os solos. 


Em fins do século XVI, o Brasil tinha não menos de 120 engenhos, que somavam um capital próximo a dois milhões de libras, mas seus donos, que possuíam as melhores terras, não cultivavam alimentos. Importavam-nos, como importavam uma vasta gama de artigos de luxo, que chegavam, do ultramar, junto com os escravos e bolsas de sal. A abundância e a prosperidade eram, como de costume, simétricas à miséria da maioria da população, que vivia em estado crônico de subnutrição. A criação de gado foi relegada aos desertos do interior, longe da faixa úmida da costa: o sertão que, com duas cabeças de gado por quilômetro quadrado, proporcionava (e ainda proporciona) a carne dura e sem sabor, sempre escassa. 


Daqueles tempos coloniais nasce o costume, ainda vigente, de comer terra. A falta de ferro provoca anemia; o instinto leva as crianças nordestinas a compensar com terra os sais minerais que não encontram em sua comida habitual, que se reduz a farinha de mandioca, feijão e, raramente, charque. Antigamente, castigava-se este “vício africano” pondo-se mordaças nas bocas das crianças ou pendurando-as dentro de cestas a grande distância do solo. 


O Nordeste brasileiro é, na atualidade, uma das regiões mais subdesenvolvidas do hemisfério ocidental. Gigantesco campo de concentração para trinta milhões de pessoas, padece hoje a herança da monocultura do açúcar. De suas terras nasceu o negócio mais lucrativo da economia agrícola colonial na América Latina. Atualmente, menos da quinta parte da zona úmida de Pernambuco está dedicada à cultura da cana-de-açúcar, e o resto não se usa para nada: os donos dos grandes engenhos centrais, que são os maiores plantadores de cana, dão-se a este luxo do desperdício, mantendo improdutivos seus vastos latifúndios. Não é nas zonas áridas e semi-áridas do interior nordestino onde as pessoas comem pior, como equivocadamente se crê. O sertão, deserto de pedra e arbustos ralos, vegetação escassa, padece fomes periódicas: o sol inclemente da seca abate-se sobre a terra e a reduz a uma paisagem lunar; obriga aos homens o êxodo e semeia cruzes às margens dos caminhos. Porém é no litoral úmido onde se padece a fome endêmica. Ali onde mais opulenta é a opulência, mais miserável se forma, terra de contradições, a miséria; a região eleita pela natureza para produzir todos os alimentos, nega-os todos: a faixa costeira ainda conhecida, ironia do vocabulário, como zona da mata, em homenagem ao passado remoto e aos míseros vestígios da floresta sobrevivente aos séculos do açúcar. O latifúndio açucareiro, estrutura do desperdício, continua obrigado a trazer alimentos de outras zonas, sobretudo da região Centro-Sul do Brasil, a preços crescentes. O custo de vida no Recife é o mais alto do Brasil, muito acima do índice do Rio de Janeiro. O feijão custa mais caro no Nordeste do que em Ipanema. Meio quilo de farinha de mandioca eqüivale ao salário diário de um trabalhador adulto numa plantação de açúcar por sua jornada de sol a sol: se o operário protesta, o capataz manda buscar o carpinteiro para que tire as medidas do corpo, para saber o quanto  de madeira será necessário para o caixão. Aos proprietários ou seus administradores continua em vigência, em vastas zonas, o “direito à primeira noite” de cada moça. A terça parte da população de Recife sobrevive marginalizada em palhoças de chão batido; num bairro, Casa Amarela, mais da metade das crianças que nascem morrem antes de chegar ao primeiro ano. A prostituição infantil, meninas de dez ou doze anos vendidas por seus pais, é freqüente nas cidades do Nordeste. A jornada de trabalho em algumas plantações se paga a preços mais baixos do que a diária mais baixa da índia. Um informe da FAO, Organização das Nações Unidas, assegurava em 1957 que na localidade de Vitória de Santo Antão, perto de Recife, a deficiência de proteínas “provoca nas crianças uma perda de peso 40% mais grave do que se observa geralmente na África”. Em numerosas plantações subsistem ainda as prisões privadas, “mas os responsáveis pelos assassinatos por subnutrição - diz René Dumont - não são presos nelas, porque são os que têm a chave”.

 

Pernambuco produz agora menos da metade do açúcar que produz o Estado de São Paulo, e com rendimentos muito menores por hectare; todavia, Pernambuco vive do açúcar, e dele vivem seus habitantes densamente concentrados na região úmida, enquanto o Estado de São Paulo contém o centro industrial mais poderoso da América Latina. No Nordeste nem mesmo o progresso é progressista, porque até o progresso está em mãos de poucos proprietários. O alimento das minorias converte-se em fome das maiorias. A partir de 1870, a indústria açucareira modernizou-se consideravelmente com a criação dos grandes moinhos centrais, e então “a absorção das terras pelos latifúndios progrediu de modo alarmante, acentuando a miséria alimentícia desta zona”12. Na década de 1950, a industrialização em auge incrementou o consumo de açúcar no Brasil. A produção nordestina teve um grande impulso, porém sem o aumento de produtividade por hectare. Incorporam-se novas terras, de qualidade inferior, aos canaviais, e o açúcar novamente devorou as poucas áreas dedicadas à produção de alimentos. Convertido em assalariado, o camponês que antes cultivava sua pequena parcela não melhorou com a nova situação, pois não ganha o suficiente para comprar os alimentos que antes produzia. Como de costume, a expansão expandiu a fome.

(FONTE: GALEANO, Eduardo. - AS VEIAS ABERTAS DA AMÉRICA LATINA. São Paulo: Editora Paz e Terra, 1989)

 

Nenhum comentário:

Postar um comentário